Esta conversa estava esboçada para ser conduzida a outro assunto, pois queria falar do verão; da cidade vazia, dessa “obrigação” de ter que ir à praia, de ser interpelado diariamente por questionamentos do tipo: não fostes à praia ainda? Como consegues ficar por aqui e nesse calorão? E por aí vão as indagações que já estou cansado de ouvir.
Mas pensando melhor, desisti do assunto, faltaram argumentos para continuar, uma vez que as idéias também não fluíram mais. Percebi que tive um enorme desgaste de energia, pois me vi diante de uma situação em que a melhor opção seria iniciar outra conversa, além da minha persistência que já estava no seu limite de produtividade. Situação difícil essa, principalmente para quem tem convicção de que a persistência é fundamental para alcançarmos nossos objetivos.
Esse fato me fez perceber que nos confrontamos freqüentemente com situações que iniciamos com entusiasmo em determinadas atividades, mas que no decorrer desanimamos. Aquilo que se mostrava prazeroso inicialmente acaba-se tornando um grande sacrifício. Essa situação nos leva a exigir um enorme esforço para terminá-las, afinal, consideramos uma fraqueza ou até mesmo um sinal de imoralidade se as abandonamos inacabadas.
A razão é que já dedicamos tanto tempo e energia, mas que, no entanto, vale a pena persistir e investir mais um pouco de esforço para concluir essa tarefa tão árdua. Esse argumento é válido quando se aplica para alguma coisa que seja meio e, conseqüentemente para alcançarmos um determinado fim, como, por exemplo, estudar para uma prova e passar de ano ou mesmo para conseguir uma vaga em determinado concurso. Nesses casos o prazer final justifica o esforço. É a ação do esforço para recompensa.
No entanto, torna-se um argumento totalmente inválido quando se trata de algo que iniciamos por mero prazer, como assistir a um filme ou ler um livro, pois continuar a investir esforço para concluir a tarefa é perder ainda mais tempo, uma vez que as horas desagradáveis já foram desperdiçadas e, concluir a atividade não iria recuperá-las. Portanto, nestes casos, nada mais inteligente que abandonar imediatamente qualquer esforço para concluí-la e iniciar nova atividade. Abandonar algo incompleto não é vergonhoso e não demonstra falta de persistência, já que, seria totalmente improdutivo persistir e teimar em seguir com uma atividade que sabemos que vai dar num beco sem saída.
Trazemos enraizado o imperativo moral de terminar tudo o que iniciamos, logo, não gostamos de abandonar nem mesmo um empreendimento claramente enfadonho e improdutivo. O fato de iniciarmos o projeto, já nos obriga a continuar até fim, como se fôssemos obrigados por uma promessa, claro que uma promessa feita somente a nós mesmos.
Perseverar para alcançar nosso objetivo com obstinação, apesar dos obstáculos que encontramos no caminho é louvável e necessário, mas é teimosia persistir em atividades chatas, relacionamentos que há tempos já se tornaram irremediavelmente amargos, em empregos que já não trazem mais satisfação nem perspectivas ou mesmo rotinas que apenas restringem nossa vida, é uma atitude questionável. Digo questionável porque respeito os diferentes valores do prazer pessoal, mas é evidente a escassez de sinais de inteligência.
É importante perceber como é fácil cair em casos, nos quais a persistência pode tornar-se negativa. Assim persistimos em fazer algo que não traz qualquer gratificação, unicamente pelo hábito de persistir. Persistir é importante para alcançarmos nossas metas em busca da felicidade, por exemplo, mas jamais deve ser confundida com teimosia.
A persistência negativa é mais destrutiva que a ausência de qualquer outro traço de persistência, pois está por trás de muitas fobias. Abandonar uma atividade pode nos trazer experiências e relacionamentos capazes de nos proporcionar agradáveis momentos. Persistir sempre, desistir jamais, desde que seja algo que nos acrescente algum valor, ou seja, algo que nos pareça valer à pena. Pense nisso.
31.01.08