Jair A. Pauletto
O Singular do Plural
Capa Textos E-books Fotos Perfil Livros à Venda Contato Links
Textos
Pós-conceito
 
Uma das coisas abomináveis do mundo atual é uma pessoa preconceituosa. Raras, talvez impossíveis de serem encontradas, as livres de qualquer preconceito. Porém se proliferam em abundância as que apontam o preconceito alheio. Uma mostra válida do mundo atual: os preconceituosos e os caçadores de preconceituosos. Talvez uma simplificação exagerada, mas consideremos um exemplo válido. Então, mesmo considerando somente essa pequena estratificação, o embate é feroz. E, sendo a realidade composta de muitas outras variáveis, cá estamos nós, neste mundo de constantes embates, sejam claros ou subterrâneos, confrontos e mais confrontos.
Naturalmente o mundo está sempre em evolução e eis que, dentro na nossa amostra, surge uma nova espécie: os pós-conceituosos. Esses, os esclarecidos, que a muito buscaram formar uma opinião fundamentada no melhor da intelectualidade, são os autointitulados conhecedores dos preconceitos históricos e atuais da humanidade. Estabeleceram seus próprios conceitos fundamentados nos seus estudos, no desenvolvimento das suas convicções, nas preferências, ideologias e por fim adotaram um certo conceito. Um conceito fundamentado, consistente, bem construído que encontra admiração e generaliza-se na sociedade. Portanto, difícil de ser atacado, até porque ser preconceituoso é indefensável.
Contudo, me preocupa o crescimento destes, que formaram um conceito do que é ou não é preconceito. Tudo o que foge a seus conceitos é preconceito. Uma espécie de preconceito ainda mais ignorante, retrógrado e  abominável que o preconceito vigente.
O pós-conceito é mais nocivo que o próprio preconceito, uma vez que é implacável, prepotente e, principalmente, impõe uma superioridade egoica. Ser pós- conceituoso é limitar-se, aprisionar-se nos próprios conceitos e ver o mundo de forma restrita, a forma definida em seu conceito. Perder a flexibilidade e limitar é meio caminho para o autoritarismo e o isolamento. Aliás, é comum, ao ver-se isolado, passar a considerar-se superior, e se conseguir encontrar uma meia dúzia de seguidores, admiradores, então, sente-se trilhando o caminho da onipotência.
O pós-conceituoso é uma figura presente em todos os seguimentos sociais, portanto é comum encontrá-lo no clube, no trabalho ou até mesmo em casa. Em casa é preciso muito amor para aturá-lo, no clube, o mais fácil é evitá-lo; mas; no trabalho, geralmente, é a situação mais difícil de suportar. Por ter conceitos fundamentados na mais refinada intelectualidade, passa a ser admirado. Aliás, os pós-conceituosos são admiráveis em seu segmento de conhecimento, o problema surge quando, acostumados a ditar ou até impor seus conceitos, passam a fazê-lo em qualquer assunto. Mesmo que conheçam os princípios básicos, mesmo que em determinado momento atitudes equivocadas tenham obtido o resultado desejado, baseados na prepotência dos seus pós-conceitos, passam a adotar opiniões equivocadas como regras infalíveis de gerenciamento, liderança ou gestão. São aos danos gestores que encontramos em nossas instituições, são mais presentes e danosos nas públicas, onde se perpetuam com maior facilidade, agregando ideologias pessoais como regras universais.
Mas é dos meios de comunicação que eles encontram o campo fértil para inflar seus egos com seus pós-conceitos. Bata dar-lhe espaço que constroem um pensamento lógico e fundamentado capaz de sustentar o próprio conceito, independente da veracidade, atualidade ou utilidade. Os pós-conceituosos crescem soltos, ditando conceitos preconceituosos na mesma forma e intensidade do preconceituoso tradicional.
Não ser preconceituoso é não ter preconceito com conceito algum, mesmo que equivocado. Enquanto que esses pós-conceituosos não passam do mais puro preconceito. Mesmo que tecnicamente desempenhem o papel de respeitadores das diferenças, esquecem que as pessoas não são iguais, e que a verdade é uma só. E como dizia Platão, se a verdade é conhecida deve ser obedecida, e obedecer a verdade é sinal de inteligência.
Luto com meus preconceitos, mesmo considerando-me livre dos socialmente condenáveis, da mesma forma que combato meus pós-conceitos. Contudo, não deixo de lutar contra esta nova espécie de preconceito dos pós-conceituosos, ciente do próprio contraditório e de que, no mundo ideal, sequer a ideia de lutar seria razoável.

Jaìr A Paùlétto
Enviado por Jaìr A Paùlétto em 18/03/2013
Alterado em 18/03/2013
Comentários
Capa Textos E-books Fotos Perfil Livros à Venda Contato Links